Jesus o estrategista I

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Jesus o estrategista I – O Mestre concentrou, estrategicamente, a luta contra o bloco ideológico , visando quebrar a hegemonia do conjunto das elites judaicas (bloco histórico)e sua aliança com Roma
Livro O Templo – Resgate do sentido original da doutrina de Jesus:
http://tribodossantos.com.br/pdf/O%20Templo%20-20introdu%C3%A7%C3%A3o.pdf

Jesus afirmara ser, indiscutivelmente, o Filho Primogênito do Deus Vivo (cf. Mt 16, 16; 22, 31-32; Jo 5, 19-29; 7, 16-18), e que sua doutrina advinha de Deus: “Se alguém me ama guardará a minha palavra, e meu Pai o amará, e nós viremos a ele, e nele faremos nossa morada. Aquele que não me ama não guarda as minhas palavras. A palavra que tendes ouvido não é minha, mas sim do Pai que me enviou”. (Jo 14, 23-b-24; cf. Jo 5,19-20; 7, 16-18, etc.). Pois, o Pai o enviou, para revelar ensinamentos, a fim de libertar os indivíduos das cadeias ideológicas (trevas) em que estes eram mantidos pelos ideólogos hegemônicos (cf. Mt 16, 6-12; Jo 8, 12-47).

No sentido acima indicado, o Filho de Deus concentrou, estratégica e prioritariamente, toda sua luta, precisamente contra os ideólogos hegemônicos (bloco ideológico), ou seja, os sacerdotes, fariseus e os “teólogos” (escribas) da sua época. Assim, o Filho do Homem desmascarou, diante da nação, tanto a natureza hipócrita da conduta dos ideólogos hegemônicos como os discursos e doutrinas falseadas destes. Desse modo, o Mestre criou uma “crise de hegemonia”, que viabilizou abrir espaço para ele desencadear sua verdadeira igreja. Ou seja, o esboço do modelo de formação social igualitária, horizontal, fraternal e radicalmente pacifista, núcleos de comunidades igualitárias descentralizadas, a “igreja de Jerusalém” inaugurada no dia do Pentecostes, sob o direção do Espírito de Deus e o de Jesus.

Jesus identificou e chamou, exclamativamente, os ideólogos hegemônicos (fariseus, saduceus e escribas) de “Serpentes! Raça de Víboras!” (cf. Mt 23, 34; 12, 34). Assim, ele se reportara à representação simbólica do magno opositor a Deus (Demônio, Satanás), enganador e sedutor dos indivíduos. Representação esta registrada no livro Gênese (cf. Gn 3, 1+). Nesse mesmo sentido, no livro Apocalipse revelado por Jesus ao Apóstolo João, o Mestre se refere ao “grande Dragão” (a intelligentsia; o bloco ideológico), identificando-o como “a primitiva serpente, chamado Demônio e Satanás, o sedutor do mundo inteiro…” (cf. Ap 12, 9; 20, 2-a).[1] Enfim, o Filho de Deus identificou o ideólogo hegemônico como o papel social de Demônio, Satanás, e serpente. O qual é exercido, por indivíduo real existente. Ou seja, o ideólogo apresenta aspectos do arquétipo do mal na cultura dos hebreus, o arqui-opositor de Iahweh, o Deus do amor e da justiça social (cf. Jó 1, 4; Lv 16, 10; 17, 7; Is 13, 21; 34, 12, 14-15).
O Jesus Histórico conseguira inculcar, na opinião pública da sua nação, a identificação básica do papel social de ideólogo hegemônico (sacerdote, teólogo ou escriba, etc.), como a “primitiva serpente”, o Demônio e Satã. Mas, os teólogos pseudo cristãos conseguiram apagar, sistematicamente, essa identificação no inconsciente coletivo. A figura do ideólogo como serpente ou Satã deixou de ser concebida como indivíduo real existente, e ficou deslocada deste mundo para o além. Ela foi reduzida a uma entidade metafísica com um tridente e um par de chifres, isto é, um gênio ou um Kakodaimon (o demônio mal dos gregos).

1.3. Jesus liderou a revolta da juventude oprimida, contra a velhacaria hegemônica.

É oportuno notar que o movimento revolucionário liderado pelo Filho de Deus consistiu, por um aspecto, na revolução da juventude oprimida e explorada por velhos aristocratas. Jovens oprimidos e explorados que exerciam trabalhos manuais, para ajudar os pais, a exemplo de Jesus (carpinteiro que ajudava a mãe); Pedro e André (pescadores que ajudavam os pais, cf. Mt 4, 18); Tiago e João (pescadores que ajudavam o pai, cf. Mt 4, 21-22); Mateus (portageiro, isto é, publicano subalterno no serviço de coleta de imposto). Segundo Tiago Menor, havia àquela época, muitos órfãos (livres ou escravizados) e respectivas viúvas necessitados e aflitos, precisando de ajuda. (cf. Tg 1, 27).
Diversas passagens do NT e em particular as Bem-aventuranças mostram Jesus exortando todos os oprimidos, a se unirem e lutarem, pacificamente, por justiça social, malgrado o poder da velhacaria sacerdotal-religiosa, política e econômica. Jesus convocou todos que choravam, os mansos, os que têm fome de justiça, os misericordiosos, os de corações puros, os pacíficos, e os que estavam sendo perseguidos por causa de lutarem por justiça (cf. Mt 5, 1-10). O Filho do Homem exortava, em particular, os jovens Apóstolos que seguiam sua liderança, ou melhor, os jovens que ele estava preparando como suas lideranças, para lutarem, destemidamente, por justiça social, a fim de libertarem os indivíduos das garras ideológicas da referida velhacaria gananciosa e opressora. Neste sentido, vejamos:

“Bem-aventurados os que têm um coração de pobre, porque deles é o reino dos céus! Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados! Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra! Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados! Bem aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia! Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus! Bem-aventurados os corações puro, porque verão a Deus! Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem, quando vos perseguirem e disserem falsamente todo o mal contra vós por causa de mim. Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus, pois assim perseguiram os profetas que vieram antes de vós. Vós sois o sal da terra. Se o sal perde o sabor, com que lhe será restituído o sabor? Para mais nada serve senão para ser lançado fora e calçado pelos homens. Vós sois a luz do mundo…” (Mt 5, 11-14-a)

É oportuno mostrar, que Paulo de Tarso o Anticristo levantou e liderou uma contrarrevolução, no sentido diametralmente oposto ao movimento social igualitário que o Jesus histórico houvera desencadeado. O Anticristo buscou e obteve aliança com as elites políticas, jurídicas e econômicas, perversas, injustas e sanguinárias do Império Romano, contra a revolução desencadeada pelo Mestre. Ou seja, contra as massas pobres e oprimidas, que Jesus defendia e procurava libertar. Neste sentido, o Anticristo teve a audácia de respaldar, incoerentemente, no Deus do Amor ao próximo e da justiça social, Iahweh, o seu discurso falseado e cheio de argumentos chulos. Assim, o Anticristo visou, por um lado, quebrar a resistência da revolução desencadeada pelo Jesus Histórico e prosseguida pelos seus genuínos Apóstolos, e por outro lado, criar uma religião cômoda. Religião cômoda para aqueles que desistiam de seguir a genuína religião de Jesus, e para os gentios que desconheciam esta religião genuína, e também queriam uma religião cômoda:

“Cada qual seja submisso às autoridades constituídas. Porque não há autoridade que não venha de Deus, e as que existem foram instituídas por Deus. Assim, aquele que resiste à autoridade, opõe-se à ordem estabelecida por Deus; e os que a ela se opõem atraem sobre si a condenação. Em verdade, as autoridades inspiram temor, não a quem pratica o bem, e sim a quem faz o mal! Queres não ter o que temer a autoridade? Faze o bem e terás o seu louvor. Porque ela é instrumento de Deus para teu bem. Mas, se fizeres o mal, teme, porque não é sem razão que leva a espada: é ministro de Deus, para fazer justiça e para exercer a ira contra aquele que pratica o mal. Portanto, é necessário submeter-se, não somente por temor do castigo, mas também por dever de consciência. É também por esta razão que pagais os impostos, pois, os magistrados são ministros de Deus, quando exercem pontualmente este ofício. Pagai a cada um o que lhe compete: O imposto a quem deveis o imposto; o tributo a quem deveis o tributo; o temor e o respeito, a quem deveis temor e respeito” (Rm 13, 1-7,).

   “Exorta aos servos a que sejam submissos aos seus senhores e atentos em agradar-lhes. Em lugar de reclamar deles e defraudá-los,procurem em tudo testemunha-lhes incondicional fidelidade, para que por todos seja respeitada a doutrina de Deus, nosso salvador”. (Tt 2, 9-10);

  

O Anticristo teve a audácia de respaldar, ainda incoerentemente, não só no Deus do Amor ao próximo e da justiça social, mas também, no próprio Jesus Cristo revolucionário, o seu discurso ironicamente mentiroso e descarado:

“Acima de tudo, recomendo que se façam preces, orações, súplicas, ações de graça por todos os homens, pelos reis e por todos que estão constituídos em autoridade, para que possamos viver uma vida calma e tranquila, com toda a piedade e honestidade. Isto é bom e agradável diante de Deus, nosso Salvador, o qual deseja que todos os homens se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade. Porque há um só Deus e há um só mediador entre deus e os homens: Jesus Cristo, homem, que se entregou como resgate por todos. Tal é o fato, atestado em seu tempo; e deste fato – digo a verdade, não minto – fui constituído pregador, apóstolo e doutor dos gentios, na fé e na verdade” (1Tm 2, 1-7);

“Servos, obedeceis aos vossos senhores temporais, com temor e solicitude, de coração sincero, como a Cristo” (Ef 6, 5.)

A nata da velhacaria em apreço compunha o “Sinédrio nacional” (Grande Conselho dos judeus que se reunia no Templo de Jerusalém ou na casa do sumo pontífice) constituído de 72 membros: 24 sacerdotes, 24 escribas e 24 anciãos. Este Conselho tomava conhecimento dos casos graves de doutrina, de jurisprudência ou de caráter administrativo, que afetavam a religião e a nação judaica. Os romanos reconheciam os decretos do Sinédrio. Em cada cidade da Palestina havia o Sinédrio local, subordinado ao supremo Sinédrio, e igualmente constituído da referida velhacaria.[2] Mateus focalizou um grupo que nomeou ora de “anciões do povo”, ora de “anciãos”, mostrando-os sempre associados com o bloco ideológico, e ambos empenhados, obstinadamente, na morte do Filho de Deus (Mt 26, 47, 57; 27, 1, 3, 11-12, 20, 39-41). Bloco ideológico esse constituído de sacerdotes fariseus, saduceus e respectivos escribas. Cujos representantes no Sinédrio consistiam, também, de velhos ideólogos aristocratas, ou seja, anciãos poderosos e gananciosos. Os quais submetiam ideologicamente e exploravam economicamente, prioritariamente os jovens.

O grupo de “anciãos do povo” ou “anciãos” que Mateus focalizou, consistia numa classe fundamentalmente econômica. Pois, esta classe era composta, certamente, de grandes latifundiários, comerciantes, construtores, agiotas com valores depositados no “templo de Jerusalém” (a grande instituição financeira daquela região), etc.[3] Classe econômica esta fundamental na estrutura social. A qual exercia, também, a atividade política, enquanto constituída de proeminentes membros aristocratas leigos, e a terça parte do Sinédrio.

Notem, Os sacerdotes e teólogos (escribas) hegemônicos e os “anciãos do povo” foram os que planejaram (cf. Mt 12, 14; 21, 46; 26, 3-5, 14, 47,57,59-66; 27, 1, 11, 18; Jo 7,1, 20; 8, 59; 10, 31, 39; 11, 8, 48-50, 57; 18, 4, 12, 32-35), exigiram (cf. Mt 27, 20-25; Jo 18, 40; 19, 6-7, 12, 15) e obtiveram a morte do Filho de Deus! (cf. Mt 27, 26, 31, 50; Jo 19, 16-18, 28-30)

[1]. Cf. Mannheim, K. Ideologia e Utopia, p. 38, 178-188: intelligentsia: o conjunto dos ideólogos que elaboram visões de mundo e as inculcam nos indivíduos das suas respectivas nações, submetendo-os, assim, ideologicamente. Cf. Gramsci, A. Os intelectuais e a formação da cultura, p. 3-23; Portelli, H. Gramsci e o bloco histórico, p. 65-68. Hegemonia e bloco ideológico: grupos de intelectuais e suas respectivas instituições sociais hierarquizadas (bloco ideológico) organicamente articulados com os demais segmentos (econômicos e políticos) das elites, propiciando, assim, a formação de ampla hegemonia sob a direção do “grupo fundamental”, que para Gramsci é o que detém e dirige “o mundo da produção econômica”.

[2]. Cf. Bíblia Sagrada. Tradução do Padre Figueiredo, A. P. Em adendo o “Dicionário prático de cultura católica e geral”. Sinédrio, p. 255.

[3]. Cf. Shlaepfer, C. F.; Orofino, F. R.; Mazzarolo, I. A Bíblia: introdução histórica e literária, p. 134-136: o Sinédrio era constituído pela aristocracia leiga e sacerdotal judaica; o tesouro do Templo era considerado a maior instituição financeira daquela época.