Lamec e Sela e seus dois filhos: Tubal-Caim e Noema

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Livro teoria da História  (Art. 28, 2.7.6.;2.7.7;2.7.8., p. 206-211) www.tribodossantos.com.br

A instituição social do Grande Mercado é autônoma e submete os seus criadores, ou seja, os indivíduos. E, percorre a sócio-história, de modo alheio às vontades dos seus criadores. Assim, a instituição do Grande Mercado em seu estágio macro-regional bipolarizado (segundo Lamec cf. Gn 4, 19-24) submete e explora, simultaneamente, através dos seus agentes diretores, dois distintos conjuntos de forças de trabalho, uma chamada Ada, em distinção à outra chamada Sela. Ou seja, o mercado bipolarizado Lamec explora tanto as forças de trabalho (uma das suas duas “mulheres”) representadas no símbolo Ada como as forças de trabalho (a outra das suas duas “mulheres”) representadas no símbolo Sela. Isto é, o Lamec bipolarizado explora as forças de trabalho, por um lado, em cada cidade do bloco da macro-região, que é representado, respectivamente, no signo Ada, e por outro lado, em cada cidade do bloco dessa mesma macro-região que é representado no símbolo Sela.[1]

   O segmento “Sela” das forças de trabalho gerou ou deu origem (“deu à luz”), sob a direção exercida, hegemonicamente, pelo Grande Mercado macro-regional em seu estágio bipolarizado (Lamec), às condições objetivas necessárias e respectivos dois “filhos” (dois novos modelos de fenômenos sócio-históricos). Ou seja, os “cônjuges” “Lamec” e “Sela” deram origem, no Sul, Vale ou Alto Egito, cuja capital era Hieracômpolis ou Nekhen, a dois “irmãos”. Já vimos que a relação consanguínea “irmãos” é empregada como metáfora de cooperação ou divisão social do trabalho. Desse modo, o segmento das forças de trabalho “Sela” deu origem, em distinção e oposição a “Ada”, a dois novos e significativos fenômenos sociais. Os quais se relacionam entre si, segundo a noção de divisão social do trabalho. Notemos que o autor quer colocar em destaque esses dois fenômenos sócio-históricos significativos. Os quais são representados, simbolicamente, nos termos Tubal-Caim e Noema.

2.7.7. Lamec e Sela, e seu filho Tubal-Caim:

    “Lamec tomou duas mulheres, uma chamada Ada e outra Sela. Ada deu à luz Jabel, que foi o pai daqueles que moram em tendas, entre os rebanhos. O nome do seu irmão era Jubal, que foi pai de todos aqueles que tocam a cítara e os instrumentos de sopro. Sela, de seu lado, deu à luz Tubal-Caim, o pai de todos aqueles que trabalham o cobre e o ferro. A irmã de Tubal-Caim era Noema” (os grifos em negrito são nossos)” (Gn 4, 19-21)

   É importante entendermos bem o sentido do termo “pai”, que relaciona, respectivamente, de um lado (pai), Jabel, Jubal e Tubal-Caim, e de outro lado (filhos), “os que vivem em tendas e têm rebanhos”, “todos os que tocam lira e charamela” e “todos os laminadores em cobre e em ferro”. Pois, nestes casos, o termo “pai” não expressa a noção contida na relação genealógica de “filiação” (vínculo que a geração cria entre os filhos e seus genitores). Mas, recebe, por conotação, a noção de inclusão. Neste sentido, a corporação profissional é concebida como entidade coletiva. A qual é representada, simbolicamente, na figura de um “pai” em relação aos seus “filhos”. Ou seja, ela inclui ou congrega todos os profissionais de um mesmo ramo de negócio ou atividade, os quais lhes são afiliados. Desse modo, podemos esclarecer os significados das representações figuradas na paternidade de Jabel e seus filhos, de Jubal e seus filhos, e de Tubal-Caim e seus filhos.
Assim, “Tubal-Caim” (corporação de mineradores, e, de manufatureiros que produzem derivados de minerais ) é concebido como “pai”, isto é, ele congrega “todos aqueles que trabalham o cobre e o ferro” (todos os profissionais do ramo de mineração e o das manufaturas derivadas deste setor).

   No sentido inverso, a relação entre as corporações profissionais e seus afiliados ou membros pode ser considerada, na pessoa dos últimos, como uma relação de pertinência. Desse modo, o autor considera que: A) “os” (os indivíduos profissionais) “que vivem em tendas e têm rebanhos” (do comércio caravaneiro) – segundo suas diferentes funções neste ramo de negócio – são membros das corporações de mercadores (Jabel); B) “Todos” (os indivíduos profissionais) “que tocam lira e charamela” (que produzem cultura ou “arte”) – segundo suas diferentes funções – são membros das respectivas corporações ou instituições culturais (Jubal), sejam da natureza religiosa, filosófica, etc.; C) “Todos” (os indivíduos profissionais) “laminadores em cobre e ferro” (que extraem minerais e produzem derivados desta matéria prima) – segundo suas respectivas especialidades – são membros das corporações de mineradores, e, de manufatureiros que produzem derivados de minerais (Tubal-Caim).

   O símbolo Tubal-Caim representa, notadamente, o setor de mineração e o das manufaturas derivadas deste setor, no contexto da divisão social do trabalho que se desenvolvem na cidade Henoc. Tubal-Caim representa, mais especificamente, as manufaturas ou guildas de mineradores e de manufatureiros, sobremodo os que trabalham com derivados de minerais, mas também na fabricação de tecidos, embarcações, vasos, etc.

   A título de codificação, o autor da Teoria da História nomeia o fenômeno sócio-histórico cujo nome comum é “corporações manufatureiras”, sem empregar essa nomenclatura. Mas, chama-o pelo nome de um atributo ou função relevante, que é pertinente a esse fenômeno sócio-histórico. Atributo ou função este que o autor quer ressalvar, e através do qual podemos identificar a natureza dessa corporação. Assim, o fenômeno sócio-histórico cujo nome comum é corporações manufatureiras ou guildas de profissionais na área industrial recebe a designação de “Tubal-Caim”. Vejamos o sentido literal deste termo. De um lado (Tubal), “Tubal (nome de um povo do Norte, Gn 10, 2, na região dos metais”;[2] “…os filhos de Jafé (a exemplo de Tubal) povoam a Ásia Menor…”[3] De outro lado (Caim), “Caim significa ‘laminador’ em outras línguas semitas”;[4] o termo Caim “assemelha-se ao termo gana, que significa adquirir”.[5] Com a associação dos significados dos dois nomes acima indicados (Tubal; Caim), o autor da Teoria da História pretendeu destacar dois importantes modelos de corporações profissionais. Importantes modelos estes distintos tanto das corporações de mercadores como das guildas de ideólogos, ambas representadas no signo Ada (Baixo Egito).

   Os dois importantes modelos de corporações profissionais designados de “Tubal-Caim” são concebidos, por um aspecto, como distintos também entre si, e por outro aspecto, como sendo intimamente relacionados entre si. O símbolo “Tubal” representa as corporações de profissionais proprietários, ligados à atividade de mineração. Isto é, que dirigem os meios de produção (força de trabalho, ferramentas, etc.) empregados para transformar substâncias brutas em minerais: exploração (extração, transporte e depuração) de minas. O símbolo “Caim” representa as corporações profissionais, que adquirem minerais já com alguma purificação, para beneficiá-lo com trabalhos materiais e técnicas mais sofisticadas. Por exemplo, guildas de profissionais que praticam as ligas de metais, a solda, a fundição com molde de cera, o polimento, a filigrana, a incrustação e o embelezamento por meio de esmalte, a cantaria. E, ainda, os profissionais que produzem lâminas de metal, a exemplo da arma branca.

   Enfim, o autor da Teoria da História ressalvou as corporações ligadas às atividades de mineração, e as ligadas às manufaturas que empregam minerais como matéria prima, para a produção de diferentes tipos de derivados de diferentes substâncias minerais. Pois, estas atividades representam um considerável grau de desenvolvimento industrial na cidade. Desse modo, ele deixa subtendido a existência dos tipos mais tradicionais de manufaturas (tecidos, vasos, etc.), no estágio de complexidade da divisão do trabalho na cidade, onde a mineração e a produção de seus derivados já aparecem.

   É oportuno notar que a Teoria da História focalizou, relevantemente, diversos aspectos da divisão social do trabalho na cidade. Ela focalizou, de um lado, a divisão social do trabalho entre as guildas mercantis e as guildas culturais ou “artísticas” incluídas no bloco representado no signo Ada (Norte, Delta ou Baixo Egito) , e de outro lado, as guildas ligadas à mineração (Tubal), as quais foram apresentadas como intimamente relacionadas às guildas ligadas à manufatura de derivados de minérios (Caim), e o segmento social nomeado “Noema”, cujo significado veremos logo adiante. Ela focalizou, ainda relevantemente, a divisão social do trabalho e oposição entre, de um lado ( Ada ou Baixo Egito), as guildas mercantis e as culturais, e de outro (Sela ou Alto Egito), as guildas ligadas à mineração mais as ligadas à produção de derivados de minerais, e “Noema”.

2.7.8. Lamec e Sela, e sua filha Noema

   O símbolo “Noema” representa os significativos segmentos sociais, que “cooperam”, no contexto da cidade-estado, com as corporações ligadas à extração de minérios, e com as corporações ligadas à produção de derivados de minérios. Esses dois gêneros de corporações são constituídos de indivíduos proprietários, que exercem trabalhos intelectuais aplicados na direção ou operacionalização dos respectivos tipos de atividades. Os segmentos sociais que cooperam, isto é, dividem socialmente os trabalhos com os integrantes de tais corporações, consistem nas respectivas forças de trabalho. As quais são submetidas, dirigidas e exploradas pelos concernentes integrantes dessas corporações. Tais corporações podem pertencer a particulares, ao Estado (neste caso, o rei é o principal ou um dos grandes capitalistas), ou aos templos, ou a alguma forma de conjugação estabelecida entre esses três poderes. As forças de trabalho podem ser constituídas de escravos por conquista (empregados, sobretudo, nas minas), escravos por dívidas, jornaleiros, servos, etc. Enfim, estamos tratando das relações sociais de produção manufatureira.

   O gênero feminino que o autor da Teoria da História atribui ao fenômeno sócio-histórico (Noema), que divide o trabalho social com os profissionais que integram as corporações em apreço, indica que tal fenômeno social consiste em forças de trabalho e seus excedentes. Pois, já vimos que a Teoria da História sempre emprega a noção de “mulher”, para representar, simbolicamente, as forças de trabalho, como se estas fossem do gênero feminino.

   O sentido literal do termo Noema é “percepção”.[6] Com esta noção, o autor parece querer indicar a natureza do tipo de conhecimento desenvolvido pela práxis do indivíduo, que exerce trabalho material produtivo, em cada especialidade em questão. Trata-se de uma noção de conhecimento que é obtido através dos sentidos e respectiva percepção. Ou seja, conhecimento que vem da experiência, enfim, conhecimento empírico, técnica, ciência. Conhecimentos estes abstraídos acerca da natureza e da utilidade das coisas materiais (substâncias minerais, vegetais, etc.), e também acerca das técnicas desenvolvidas ao lidar com tais substâncias, no processo de transformá-las em produtos de uso e/ou de troca. Esses conhecimentos se desenvolvem no contexto da divisão social do trabalho material e intelectual. Assim, eles são apropriados pelos membros proprietários das corporações, os quais exercem o gênero de direção ou operacionalização de trabalho intelectual, aplicado na produção de minérios e dos seus derivados.

   O termo “Noema” poderia receber como conotação, as noções de “a amada” e “a alegria”.[7] Estas conotações seriam pertinentes aos segmentos trabalhadores pobres, pois são estes que dão alegria e são amados e defendidos por Iahweh (Cf. Ex 3, 7; 22, 22-23; 23, 6, 10-11).

[1]. Cf. http://tribodossantos.blogspot.com.br/2013/04/o-mercado-macro-regional-bipolar-lamec.html
[2] Veja o esclarecimento fornecido por exegeta, na Bíblia de Jerusalém, no rodapé da p. 40, item “a”, referente ao Gn 4, 22.
[3] Idem, p. 47, item “a”, referente ao Gn 10, 2.
[4]Idem, p. 40, item “a”, referente ao Gn 4, 22.
[5]Veja o esclarecimento fornecido por exegeta, na Bíblia “Ave Maria”, no rodapé da p. 52, referente ao Gn 4, 1.
[6] Cf. Novo Dicionário Aurélio.
[7] Veja esclarecimento fornecido por exegeta, na Bíblia de Jerusalém, no rodapé da p. 40, item “a”, referente ao Gn 4, 22: “Noema. ‘ a alegria’, ‘a amada’, poderia ser epônimo de outra ‘profissão’, sobre a qual o texto se cala”.